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Equipe de Comunicação

Ativista brasileiro participa de evento no Canadá sobre diretrizes em saúde

26 de setembro de 2022

Ezio Távora faz parte da Força-Tarefa da Sociedade Civil contra a Tuberculose (CSTF) da Organização Mundial de Saúde (OMS)

Jorn Liandro Lindner

Encerrou neste sábado (24/09) em Toronto, Canadá, a 17a Conferência da Guidelines International Network (GIN), a Rede Internacional de Diretrizes. Essa é uma rede de organizações e indivíduos que trabalham na produção de diretrizes de saúde, baseadas em evidências. O GIN possui uma das maiores bibliotecas internacionais de diretrizes do mundo. O ativista brasileiro Ezio Távora, advogado e doutor em Políticas de Saúde, é membro do Comitê Comunitário de Acompanhamento em Pesquisas de Tuberculose (CCAP TB BR) e Coordenador dos Projetos de Engajamento Comunitário da Rede Brasileira de Pesquisadores em Tuberculose (REDE-TB) foi convidado para o evento.

Ele participou como palestrante de sessão plenária e facilitação de painel na conferência. Sua participação deu-se particularmente em função da Força-Tarefa da Sociedade Civil (CSTF) da Organização Mundial de Saúde (OMS), da qual participa. O CSTF é um coletivo internacional que atua junto à Direção da Organização Mundial de Saúde por meio do Programa Global de Tuberculose (GTB) e outros departamentos e programas da OMS.

A GIN completou 20 anos. Fundada em 2002, atualmente com 111 membros organizacionais e 240 membros individuais de 61 países, a GIN tem como objetivo colaborar na melhoria da saúde pública, usando evidências e implementando diretrizes baseadas em evidências.

Ezio, nesta entrevista, conta sobre o evento, as novidades apresentadas e a necessidade de apropriação da sociedade civil sobre este tema.

  • Como foi que surgiu o convite para você participar desta conferência?

Eu confesso que desconhecia o GIN como tal, como uma grande rede de várias abordagens de análise de pesquisas. Porém descobri que muitos brasileiros já participam!,

O convite que recebi veio pelo Prof. Holger Schunemann, da Universidade McMaster, em Hamilton, Ontário. Holger coordenou alguns Grupos de Desenvolvimento de Diretrizes (GDG) de tuberculose da OMS dos quais participei. O grupo de pesquisadores da McMaster foram os (co)responsáveis pelo desenvolvimento da metodologia/abordagem GRADE (https://training.cochrane.org/resource/grade-approach-rate-certainty-evidence-network-meta-analysis-and-summary-findings-tables). Trata-se, dentre outras coisas, de uma abordagem para avaliar a certeza das evidências de meta-análises (levantamento de resultados de estudos correlatos). Os membros do GIN e da McMaster também desenvolveram as tabelas de resumo dos achados, e as questões PICO (População/problema/paciente; Intervenção; Comparação; Outcome/resultado), que facilitam a análise dentro de um T: tempo/período, tipo de estudo ou tipo de questão. Esses métodos e abordagens são os utilizados pela OMS para o desenvolvimento das diretrizes globais, e mais recentemente também foram adotadas pelo Ministério da Saúde do Brasil.

O convite deu-se em função da intensificação e reconhecimento da participação comunitária em desenvolvimento de diretrizes, particularmente da tuberculose da OMS, que se destaca muito em comparação com outros departamentos da organização.

Eles queriam que eu falasse da minha experiência de coordenação dos componentes de Engajamento Comunitário de algumas pesquisas multicêntricas internacionais da experiência em participação comunitária nos GDG.

  • Como você avalia a participação da sociedade civil em eventos deste tipo e qual a importância da voz comunitária ser levada a estes espaços?

Se a sociedade civil, entendida como as ONG, redes e outras entidades, pretende incidir na melhoria das políticas, precisa ocupar esses espaços e participar de forma significativa, qualificada. Ter voz ativa e contributiva.  A educação em pesquisa é necessária para bem se utilizar os resultados dela para o desenvolvimento de novas diretrizes, novas políticas.

A participação comunitária, entendida como participação de pessoas que se identificam como afetadas por doenças, é fraca. Eu diria que parecia ser o único participante que se colocou como tal. Entretanto, há uma miríade de representantes de organizações da sociedade civil, em diversas áreas da saúde, que trabalham com a participação comunitária. Fiquei surpreso. Muito interessante.

Mas note que saúde aqui é entendida além da relação saúde-doença. Envolve, por exemplo, áreas como nutrição/alimentação, utilização de espaços públicos (ou privados) de desporto, dentre diversas outras coisas.

Note que desenvolvimento de diretrizes é muito mais que apenas o estabelecimento das diretrizes de diagnóstico ou tratamento, às quais conhecemos mais de perto.

Ficou claro que há um esforço em diversas áreas de consulta e participação das populações afetadas ou populações alvo no desenvolvimento de diretrizes, mas ainda não é protagonismo, não é voz própria.

Creio que o convite que me foi feito buscou trazer essa perspectiva e incentivar o aumento dessa participação no desenvolvimento de diretrizes. Acho que isso ficou evidente ao final do evento.

  • A noção de diretriz baseada em evidência, teve recentemente forte questionamento no Brasil, especialmente durante a fase aguda da pandemia da Covid-19. Como você acha que o tema poderia ter maior alcance e conhecimento das populações mais afetadas e vulneráveis?

As controvérsias, e os diversos absurdos do afastamento da ciência que vivenciamos globalmente – e particularmente no Brasil -, foram amplamente discutidas. Entretanto, esses membros da rede de desenvolvimento de diretrizes são em sua maioria acadêmicos. Vi pouco destaque na participação de gestores, mas vi diversos relatos da aplicação de diretrizes em inúmeras áreas. Destaco que vários membros de agências regulatórias e comitês de regulação, como a CONITEC do MS do Brasil participaram ativa- mas virtualmente. Apresentaram muitos trabalhos virtuais. Outros pesquisadores de instituições privadas de pesquisa do Brasil, colaboradores do MS, também estavam presentes.

Acho que para responder à sua pergunta sobre o afastamento da ciência, me pareceu uma unanimidade que isso depende de educação junto aos públicos-alvo ou da comunicação para o público em geral. O papel da imprensa também foi discutido na última plenária, da qual participei.

  • Em relação a tuberculose, o evento trouxe algumas novidades em relação a diretrizes? A questão da pobreza, da fome e da falta de acesso as discussões chegaram a avançar neste cruzamento e combate a estas realidades?

Não exatamente sobre diretrizes da tuberculose. O avanço na elaboração e revisão das diretrizes globais de tuberculose, e tantas outras da OMS, foi sim muito discutido. E diversas outras diretrizes, em diversos níveis e áreas.

Mas os membros dessa rede não se vêem como autores das diretrizes. Mais facilitadores, metodologistas. Participantes dos processos.

Houve interessantes apresentações e discussões sobre os determinantes sociais da pobreza e exclusão, e tiveram destaque. Obviamente que na minha fala e discussão sublinhei a crescente pobreza, exclusão como ameaça ao próprio avanço na implementação de diretrizes.

Destaquei em particular a importância dos Comitês Comunitários de Acompanhamento em Pesquisas (CCAP) como agente e sujeito estratégico para investimento. Sem ligação com as comunidades, não é possível ter maior efetividade nas políticas.

Sobre a falta de acesso às discussões, acho que a participação nesse evento mostrou a abertura existente. Entretanto, a barreira da língua e de conhecimento científico para as comunidades são um fato. Há muito por avançar. De todos os lados.

  • Uma das maiores dificuldades de entendimento, por parte dos movimentos comunitários, é o entendimento da linguagem acadêmica e científica utilizado em espaços como estes. Você acredita que houve avanços nesta distância, ou ainda se precisa avançar nisto e de que forma ?Acredito que os avanços na implementação de CCAP e engajamento no acompanhamento de pesquisas tem qualificado um número crescente de pessoas, formado novos ativistas. Temos capacitado um número maior de pessoas. Acho que ninguém espera que os ativistas se transformem em pesquisadores – ainda que uma pequena parcela faça essa transição ou transbordamento de forma excelente. Entretanto, capacitação, educação, é necessidade permanente. Inclusive dos pesquisadores! E isso também foi falado.

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